segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O Primeiro Poder


Como acontece com todos os eixos temáticos discutidos aqui no Cabeça, procuro partir do cotidiano, ou seja, da vida concreta, para buscar, na teoria, alguns olhares sobre os problemas por mim percebidos no dia-a-dia. Com a comunicação, uma das áreas de interesse do blog e objeto de estudo da página Média Mídia, não podia ser diferente.

Sempre me considerei um ouvinte, leitor, espectador e telespectador consciente, mas, confesso que depois que resolvi também me dedicar ao estudo dos meios de comunicação aqui no blog, meu olhar ficou mais atento e rigoroso com relação ao que é veiculado pela mídia.

Do final do primeiro semestre pra cá, percebi alguns probleminhas, seja do ponto de vista ideológico, ético, político ou estético, relacionados com a imprensa pernambucana. Se me permitem, vou comentar alguns deles para em seguida defender a importância de desenvolvermos uma leitura crítica sobre os meios de comunicação.

No final do primeiro semestre, a Rede Globo NE, no telejornal NE TV, ao fazer a cobertura da greve dos professores da rede privada de Pernambuco, informou que a opção pela greve, no dia anterior, fora por “unanimidade”. Quando vi a reportagem pensei: “’pera’ aí: unanimidade não significa a completa concordância de todos sobre algum ponto sujeito a apreciação?” Rigorosamente falando, a vitória da “opção greve” não foi unânime, pois, pelo menos eu havia votado contrariamente à paralisação (motivos por mim expostos na postagem Já estávamos "parados", comecemos a trabalhar), o que contradiz a aplicabilidade do conceito “unanimedade” nessa situação específica.   

Se a emoção e a indignação (legítimas) da Diretoria e da massa dos professores presentes não permitiram que os (pouquíssimos) votos dissentes não fossem contados, nem por isso eles deixaram de existir. Acontece que, na sociedade midiática, uma coisa só passa a “existir” ou um discurso só é “verdadeiro”, se são divulgados e legitimados pelos meios de comunicação de massa. No caso aqui citado, a deflagração da greve de forma “unânime” passou para a história oficial porque a Globo assim o noticiou.

Outro problema por mim percebido foi no Diário de Pernambuco. No Caderno Aurora, do dia 09 de setembro, que traz uma reportagem sobre moradores de cabaré. A reportagem, que prometia apresentar o “cotidiano em carne viva de lares nada convencionais”, não passou da mera descrição do cotidiano de seres humanos alijados do processo de produção e consumo dos bens materiais e simbólicos. Em nenhum momento a reportagem aponta para as causas dessa realidade que ela diz retratar. Quem são esses seres humanos? Por que são obrigados a vender/comprar/alugar corpos? Qual a relação do “comportamento” desses seres humanos com a desigualdade social? Com a falta de educação? Por qual razão seus lares não são convencionais? Por escolha? Por opção? Devido à situação sócio-histórica?

Mais recentemente, gostaria de destacar a cobertura do festival No Ar Coquetel Molotov, feita por outros dois jornais pernambucanos, a Folha de Pernambuco e o Jornal do Comércio. No primeiro semestre conheci uma banda de Curitiba chamada ruído/mm. Sabendo que eles iriam tocar no Festival no sábado, dia 22 de setembro, fui conferir o som da galera. Na segunda-feira, dia 24, tive acesso a duas coberturas feitas pelos cadernos de cultura dos dois periódicos acima citados.

Não nego que meu olhar já estava procurando possíveis deslizes que pudessem corroborar as ideias que estou defendendo aqui, principalmente que devemos ter uma postura crítica, reflexiva e seletiva diante da avalanche de informações às quais estamos expostos diariamente.

Na folha, me chamou atenção a observação de que o show do Madrid, “banda de Adriano Cintra e Marina Vello, salvou a noite na Sala Cine”. Se eu fosse um leitor desatento, sem uma postura crítica e reflexiva, tomaria esse juízo de valor do jornalista como juízo de fato. Ora, o jornalista tem todo o direito de fazer julgamentos de valor, mas sua observação é, no mínimo, discutível (aliás, como todo juízo de valor!): O que exatamente ele está querendo dizer com “salvou a noite”? Que o show do Madrid foi o mais eficiente? Sob quais aspectos? Técnicos? Estéticos? De empatia com o público?  Já no Jornal do Commércio o "vacilo" foi com a veracidade dos fatos narrados. Falando sobre o show da ruído/mm o jornalista disse que a banda era mineira. Na verdade, a banda é curitibana! Alguém poderia dizer que isso é irrelevante, mas para quem  gosta não só de sentir, mas também compreender o que ouve (como é o meu caso), o lugar de origem da música é um dado a ser considerado.

Apesar de reconhecer que os meios de comunicação de massa, por atenderem ao gosto médio da população e estarem a serviço de grupos econômicos privados, acabam homogeneizando valores, comportamentos e ideias, não sou daqueles que “demonizam” a mídia, enxergando apenas sua função alienadora e manipuladora.

Nenhum meio de comunicação é, a priori, bom ou mal. Não há dúvida de que os grandes veículos de comunicação, por fazerem parte da indústria cultural, estão comprometidos com a ideologia da classe dominante, no entanto, não somos apenas receptores passivos, ou seja, “alguém que simplesmente recebe tudo o que lhe dão sem realizar nenhuma elaboração pessoal, sem fazer nenhuma síntese.” (ARANHA, M.L. e MARTINS, M.H.Temas de filosofia, 2006, p. 63)

No meu modo de ver, mais importante do que discutir se os meios de comunicação massificam, alienam ou estimulam a violência, a sexualidade e o consumismo, é a discussão sobre a necessidade de desenvolvermos uma leitura crítica sobre a mídia, que leve em conta a reflexão sobre as mensagens transmitidas e sua devida contextualização.

Para quem não consegue ler criticamente os meios de comunicação de massa, ao invés de ser o quarto, a mídia se configura como o "Primeiro Poder", no sentido de ser a principal fonte de valores, informações e conhecimentos, além de influenciar o comportamento da maioria das pessoas.   

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