sábado, 27 de outubro de 2012

Novas Competências para Ensinar: Trabalhar em Equipe

Antes de deixar vocês com minhas reflexões sobre trabalho em equipe, gostaria de combinar uma mudança na frequência das postagens. Como minha situação histórico-social ainda não me permite exercer o ócio criativo como gostaria, não tem me sobrado muito tempo para manter um intervalo rigoroso entre os textos. A partir de hoje, as quintas e as segundas-feiras ficam sendo apenas dias-referência das postagens, podendo as mesmas serem publicadas um, ou mesmo dois dias depois, dependendo do meu árduo cotidiano.

Como o tema de hoje é trabalho em equipe e amanhã, dia 28 é o Dia Internacional da Animação, e como essa expressão artística para ser realizada requer um intenso trabalho de equipe, a programação da Cabeça Bemfeita TV dessa semana traz uma seleção de curtas de animação (Obs.: minhas indicações foram: A Ilha, O animador, Mais Valia e O Mito da Caverna, outros vídeos que aparecerem foram selecionados pelo blogger). Dentro do mesmo espírito de equipe, a programação da Rádio Cabeça traz algumas bandas que admiro bastante.  Mother of Inventions e Radiohead, do lado internacional, Mutantes e Hurtmold, do lado nacional. Espero que gostem!


Uma última coisa: na página FORMAÇÃO (DES)CONTÍNUA vocês encontram dois textos que aprofundam a temática do trabalho em equipe.

Finalmente, fiquem com o texto:

Novas Competências para Ensinar: Trabalhar em equipe
 

Invariavelmente, todos os referencias de competências necessárias para o exercício da cidadania no mundo contemporâneo, apontam a habilidade de trabalhar em equipe como uma das principais. Especificamente para nós, professores, o mundo de hoje exige que, mais do que um conjunto de habilidades cognitivas, tenhamos a capacidade de trabalhar cooperativamente em equipe (Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica, 2010).

Devido a uma demanda concreta (me coloquei como iniciador de um processo de formação de equipe), recentemente precisei me apoderar de conhecimentos sobre trabalho de grupo, pois, como já falei aqui no blog, sou fruto da educação massificante e alienada que prevalece na maioria das escolas brasileiras, portanto, não construí saberes e procedimentos de formação de equipes e condução de atividades realizadas em grupo.
 
Nas minhas pesquisas cheguei ao livro 10 Novas Competências para Ensinar, de Philippe Perrenoud, onde o autor faz um inventário sobre as competências que contribuem para redefinir o papel do professor no mundo contemporâneo.

O contato com o livro me instigou a escrever uma série de cinco textos inspirados em cinco das dez famílias de competências, listadas pelo sociólogo suíço, que julgo serem fundamentais para nosso êxito como professores na sociedade atual. São elas: "trabalhar em equipe", "participar da administração da escola", "utilizar as novas tecnologias", "enfrentar os dilemas éticos da profissão" e "administrar sua própria formação contínua". Resolvi priorizar essas cinco, por considerar que as demais já se encontram, indiretamente, pressupostas nas escolhidas. 

Para falar sobre o tema de hoje, trabalho em equipe, resgato um movimento que realizei recentemente na escola onde trabalho, o Lubienska Centro Educacional, para incentivar o início da construção de um trabalho verdadeiramente de grupo.

Não sei se vocês tiveram a oportunidade de ler, mas em algumas ocasiões aqui no blog afirmei que 2012 para mim é um ano muito especial, pois senti que  era o momento de sair do isolamento e buscar outros sujeitos que, assim como eu, acreditam que as possíveis saídas para as incertezas, dúvidas e impasses colocados pela sociedade contemporânea à educação só podem ser construídas colets.

Há muito percebi que para alcançar os princípios e objetivos esperados da educação básica em geral, e da minha disciplina em particular (a Filosofia), não poderia mais trabalhar isoladamente. Na verdade, é próprio da filosofia sua função de interdisciplinaridade, estabelecendo a ligação entre as diversas ciências e técnicas que auxiliam a pedagogia.
 
Fiel a minha busca por espaços dialógicos comecei a mandar emails para os diversos sujeitos que dividem comigo a responsabilidade de criar os valores éticos, políticos, estéticos e pedagógicos do nosso espaço de vivência.

Como não sou tão ingênuo como pareço, sabia que minha missão não seria tão simples assim, pois não é fácil “falar dos medos, das fantasias de perder a autonomia, dos territórios a proteger, dos poderes a assumir ou a se submeter (Perrenoud, 1996c), das competências e das incompetências a minifestar ou a construir, em suma, de todas as vicissitudes das relações intersubjetivas (Cifali, 1994) [...]” (Perrenoud, 2000, p. 84).
Com relação ao corpo gestor, tudo tranquilo, minhas ideias foram bem recebidas. Tanto é que já estou tendo um canal de diálogo para ver como poderei agregar minhas ideias ao projeto pedagógico desse tradicional centro de educação. Mas, com relação ao corpo docente, confesso: o trabalho tem sido mais árduo do que imaginava!

Desde o simples não envolvimento, revelando uma certa apatia (o que convenhamos, é bem compreensível,  pois não é fácil manter a chama acesa perante a humilhação, a exploração e a desvalorização as quais somos submetidos e submetidas), passando até por agressão verbal a minha pessoa, e claro, minha própria inexperiência e ignorância com relação as competências envolvidas na criação e condução de atividades de grupo, têm me mostrado o quanto é difícil se apresentar para o debate e batalhar pela construção de comunidades aprendentes.

 
O movimento deu uma esfriada agora (sabem como é, fechamento de ano letivo é sempre uma correria nas escolas), mas com toda certeza teremos desdobramentos mais na frente. Por enquanto, continuo no meu processo de formação permanente para que, quando as situações exigirem, eu possa ajudar, não só lá no Lubienska, mas em todos os espaços com os quais colaboro, a encontrar as melhores saídas para os problemas enfrentados.

De qualquer forma, minha atitude foi importante principalmente por dois aspectos:
 
1)      Serviu para alertar que não formamos uma “equipe treinada”, no sentido atribuído por Perrenoud. Segundo o sociólogo suíço, cabe à equipe transmitir aos recém-chegados informações que os ajudarão a assimilar a cultura da equipe e a compreender por que se faz o que se faz e se diz o que se diz. (Perrenoud, 2000). Ora, está havendo uma inversão: eu é que tenho procurado conhecer a cultura da equipe para poder compreender o que se diz (representações) e o que se faz (práticas);
2)      Além disso, sair do isolamento foi importante para ouvir críticas e perceber vários pontos em que preciso investir para desenvolver mais minhas inteligências intra e interpessoal para evitar que a gênese de uma equipe aborte “por falta de habilidade, excesso de precipitação, ausência de escuta ou de organização, de memória ou de método.” (Perrenoud, 2000, p. 88).
 

É isso, pessoal! Obrigado pela companhia de vocês e semana que vem eu volto com mais uma competência profissional que, no meu entender, precisamos construir para podermos sobreviver nesse mundo cada vez mais informatizado e globalizado e, ao mesmo tempo, cada vez mais seletivo e excludente.
 
Um forte abraço,
 
Zebé Neto
filósofo, escritor e educador
 

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Rede Globo: cinismo com os moradores de “avenida” no Brasil

Hoje seria o dia em que começaria a movimentar a página (CONS)CIÊNCIA E TECNOLOGIA, mas não posso deixar de me posicionar diante do cinismo da Rede Globo de Televisão em uma reportagem exibida no último sábado, dia 20, no Jornal Nacional, que falava da repercussão do último capítulo do folhetim Avenida Brasil.

Depois de mostrar que o Brasil parou em frente à televisão para ver o último capítulo da novela Avenida Brasil, destacando "ruas e avenidas vazias em todo o país" (datalhe: para a Globo "todo o país" se resume à São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Manaus, Pará, Porto Alegre, Recife e Belo Horizonte), o repórter Flávio Flachel nos apresenta Dona Isabel que “não tem sala, não tem casa. Mora na rua, em Porto Alegre. Mas fez questão de juntar um dinheirinho para comprar uma TV e acompanhar até o fim, na calçada, toda a história daquele povo do lixão.”

Prezado leitor, prezada leitora, não é que a Globo conseguiu me surpreender. Tudo bem dizer que em São Paulo e no bairro da Lapa, no Rio de Janeiro, “teve gente pedindo pra trocar o som da banda (nos bares) pelo áudio da TV”, ou mesmo que “o corre-corre habitual do aeroporto de Congonhas teve pausa obrigatória onde houvesse imagem, onde estivesse passando a novela que encantou o país”, mas utilizar cinicamente  uma senhora cuja situação sócio-histórica degradante é consequência da desigualdade na distribuição das riquezas do país, que tem nos meios de comunicação de massa sua justificativa ideológica, é “tirar onda” com a nossa cara!

Para dar uma fundamentada na minha crítica à postura ideológica da Rede Globo em defesa do status quo, através do Jornal Nacional, pesquisei alguma coisa sobre o gênero televisivo telejornal. No livro Temas de Filosofia, as autoras, Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins, dizem que os telejornais “não são neutros, objetivos ou imparciais, mas deixam sempre uma brecha para que o público confronte as vozes ouvidas (às vezes contraditórias) com suas outras fontes de informação e suas experiências pessoais.” (ARANHA, M.L. e Martins, M. H.. Temas de Filosofia. 3. ed. rev. São Paulo: Moderna, 2005, p. 66).  

Pegando uma carona na brecha deixada pela fala do repórter no final da matéria, que dizia que “Avenida Brasil terminou com a mensagem de que é possível perdoar, ir além”, finalizo confrontando a voz do repórter (que na verdade traduz o discurso ideológico da Globo),  com uma leitura crítico-reflexiva da mídia, através das seguintes indagações:

Não estaria a Rede Globo, com produtos como Avenida Brasil, a estimular, via catarse coletiva, o “perdão”, ou seja, o “esquecimento”, da exploração econômica e da exclusão social a que boa parte da população está submetida?

Como diz o repórter, até Adriana Esteves “chorou vendo o fim da novela.” Não estaria na hora do brasileiro começar a chorar porque pessoas como Dona Isabel não têm casa para morar e porque gigantes da comunicação, como a Rede Globo, essa realidade insistem em camuflar?

 
Zebé Neto
filósofo, escritor e educador
 
 
 
p.s.
 
1) Quem quiser conferir, a matéria citada na postagem está disponível em http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/10/brasil-para-no-ultimo-capitulo-de-avenida-brasil.html;
 
2) A programação da Cabeça Bemfeita TV e da Rádio Cabeça é a mesma da última postagem;

3) Na página MÉDIA MÍDIA, vocês encontram um texto das professoras Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helana Pires Martins sobre gêneros televisivos. 
 

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Profissão professor: desafios e saídas

Olá, leitor e leitora do Cabeça Bemfeita, tudo bem? O texto que vocês lerão abaixo foi publicado na última quinta. Ontem e hoje fiz algumas revisões e acréscimos. Os principais acréscimos foram: um texto da educadora portuguesa Isabel Alarcão sobre "o papel do professor na sociedade da informação" que postei na página FORMAÇÃO (DES)CONTÍNUA e a nova programação da Cabeça Bemfeita TV e da Rádio Cabeça que, em sintonia com a postagem, presta uma homenagem (dentro do espírito crítico e reflexivo do blog, claro!) ao professor. Na Cabeça Bemfeita TV vocês conferem as ideias do encantador filósofo e educador Rubem Alves, enquanto na Rádio Cabeça, minha homenagem em forma de música, através  das representações sobre a escola e, consequentemente, sobre o professor, das bandas Pink Floyd, Bad Brains, Patife Band e Gabriel O Pensador.

Um último informe antes do texto: as postagens sobre filosofia, arte, ciência, tecnologia e comunicação serão agora publicadas nas segundas, enquanto as postagens dedicadas a nossa formação continuada continuam sendo publicadas nas quintas-feiras.

Espero que vocês gostem! Finalmente, fiquem com o texto:

Profissão professor: desafios e saídas

Era minha intenção que o presente texto tivesse sido publicado na última segunda, dia 15 de outubro, Dia do Professor. Acontece que, como ainda ganho a vida apenas como professor (o que implica muito trabalho, pouca remuneração e ausência de ócio criativo para me dedicar às artes e à literatura), não tenho tido muito tempo para escrever como gostaria.

Aliás, não tenho nem conseguido manter a regularidade das publicações das quintas (voltadas para a formação continuada) e dos domingos (direcionadas para a discussão de temas diversos, como arte, filosofia, comunicação e tecnologia), como o leitor e a leitora que acompanham o blog mais de perto já perceberam.

De qualquer forma, como aqui a preocupação com a valorização do trabalho docente é permanente, não importa muito o dia em que o texto está sendo publicado. O importante é que no Cabeça Bemfeita,  prezado professor, prezada professora, em qualquer dia do ano vocês encontrarão um espaço de reflexão e crítica sobre os desafios e as possibilidades colocadas pela sociedade contemporânea ao ofício de professor.

Como hoje é quinta-feira, dia reservado para nossa formação continuada, e aproveitando a “semana” do Dia do Professor, levantarei alguns desafios que nós, docentes, enfrentamos na atualidade e, em seguida, apontarei, com base na minha própria experiência e em alguns autores com os quais venho dialogando, algumas possíveis saídas para combatermos a tão falada crise civilizacional e, consequentemente, educacional, pela qual passamos.


Os desafios

Como a prática social deve ser o ponto de partida e de chegada da prática educacional, devemos estar atentos e atentas à relação sociedade-escola, pois o contexto sócio-histórico incide diretamente no nosso trabalho.

Como decorrência do desenvolvimento da ciência moderna e da tecnologia, a sociedade contemporânea vem se transformando num ritmo acelerado. As mudanças provocadas pelas novas tecnologias da informação e comunicação e os fenômenos da globalização possibilitaram a passagem da sociedade industrial à era da informação, da comunicação e do conhecimento.

Diferentemente da sociedade industrial, onde a posse dos meios de produção material (ou a posse da força de trabalho) definia as posições dos indivíduos na sociedade, na sociedade informacional o fator que determina o poder social de indivíduos e instituições é o tratamento da informação (Flecha e Tortajada, 2000).

Ora, como na sociedade da informação certas habilidades são valorizadas e requeridas, as pessoas que não dominam as competências impostas pelos grupos privilegiados que organizam, codificam e transmitem o conhecimento, correm o risco de ficarem excluídas dos benefícios proporcionados pela sociedade informação (Idem, 2000).

Até bem recentemente, eu fazia parte do enorme contingente de pessoas que nem sequer iniciou o processo de desenvolvimento das habilidades necessárias na sociedade da informação, como seleção e processamento de informação, autonomia no pensar e no agir, colocação e resolução de problemas, ser capaz de tomar decisões, trabalhar em equipe, ser flexível, etc.

Saídas


Um leitor fortuito, com uma formação mediana, que lesse algum dos meus textos pela primeira vez, poderia ser levado a acreditar que sou um mestre ou quem sabe um doutor em educação. Que nada! Essa razoável habilidade em utilizar as palavras, em comentar, discutir e relacionar conceitos ou mesmo selecionar, tratar e transmitir informações é algo bem recente na minha vida.


Ainda falta muita coisa para que eu chegue na identidade profissional que acredito ser a mais adequada para efetivar os objetivos de uma formação integral das novas gerações, no entanto, hoje, através das habilidades reflexivas que venho construindo na minha formação permanente, vejo mais claramente quais são os limites e as lacunas que impedem o melhor desempenho profissional que eu posso alcançar.

De qualquer forma, minha vida (não só profissional, mas também existencialmente falando) começou a mudar depois que eu passei a investir na minha formação continuada. Paulatinamente, fui tendo acesso a alguns autores e autoras que foram me mostrando que, apesar das dificuldades, temos condições de sairmos da crise. 
Um autor em especial, Philipe Perrenoud, tem me ajudado bastante no meu desenvolvimento teórico e prático com sua defesa da prática reflexiva e da implicação crítica da atividade do professor. 

Recentemente, na escola com a qual colabora, o Lubienska Centro Educacional, propus um diálogo e marquei uma reunião com os colegas professores e professoras do meu segmento pra ver se a gente começa a se movimentar para construir um  trabalho interdisciplinar. 
O resultado não foi lá essas coisas, mas valeu como um primeiro passo. Narro esse fato porque ele me permitiu uma aproximação do livro de Perrenoud que, apesar de ser o mais popular, ainda não tinha lido: 10 Novas Competências Para Ensinar. 

Como não fui formado em contextos de trabalho em equipe, mas quero muito desenvolver essa competência, e como tinha marcado com o pessoal, não custava nada dar uma estudada. Fui dar uma pesquisada na biblioteca da escola pra ver se encontrava alguma coisa sobre trabalho em grupo e eis que, logo de cara, no setor de Educação, vejo o livro citado. 


Das dez competências profissionais "que contribuem para redelinear a atividade docente" (Perrenoud, 2000, p. 12) que o sociólogo suíço aponta, selecionei cinco para compartilhar com vocês nas próximas quintas-feiras. São elas: "trabalhar em equipe", "participar da administração da escola", "utilizar as novas tecnologias", "enfrentar os dilemas éticos da profissão" e "administrar sua própria formação contínua". Selecionei essas cinco por considerar que as outras competências apontadas por Perrenoud ("organizar e dirigir situações de aprendizagem", "administrar a progressão das aprendizagens", "conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação", envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho" e "informar e envolver os pais") já estão, de acordo com minha leitura, pressupostas nas competências que comentarei.

É isso aí, pessoal, valeu a atenção e a compreensão de vocês. Próxima quinta eu volto trazendo algumas considerações sobre "Trabalhar em equipe". Até mais!



Zebé Neto
    filósofo, escritor e educador   

Referências bibliográficas

FLECHA, R. e TORTAJADA, I. Desafos e saídas educativas na entrada do século. In: IMBERNÓN, F. (Org.). A educação no século XXI: Os desafios do futuro imediato. 2.ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.

PERRENOUD, P. 10 novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2000.





segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O Primeiro Poder


Como acontece com todos os eixos temáticos discutidos aqui no Cabeça, procuro partir do cotidiano, ou seja, da vida concreta, para buscar, na teoria, alguns olhares sobre os problemas por mim percebidos no dia-a-dia. Com a comunicação, uma das áreas de interesse do blog e objeto de estudo da página Média Mídia, não podia ser diferente.

Sempre me considerei um ouvinte, leitor, espectador e telespectador consciente, mas, confesso que depois que resolvi também me dedicar ao estudo dos meios de comunicação aqui no blog, meu olhar ficou mais atento e rigoroso com relação ao que é veiculado pela mídia.

Do final do primeiro semestre pra cá, percebi alguns probleminhas, seja do ponto de vista ideológico, ético, político ou estético, relacionados com a imprensa pernambucana. Se me permitem, vou comentar alguns deles para em seguida defender a importância de desenvolvermos uma leitura crítica sobre os meios de comunicação.

No final do primeiro semestre, a Rede Globo NE, no telejornal NE TV, ao fazer a cobertura da greve dos professores da rede privada de Pernambuco, informou que a opção pela greve, no dia anterior, fora por “unanimidade”. Quando vi a reportagem pensei: “’pera’ aí: unanimidade não significa a completa concordância de todos sobre algum ponto sujeito a apreciação?” Rigorosamente falando, a vitória da “opção greve” não foi unânime, pois, pelo menos eu havia votado contrariamente à paralisação (motivos por mim expostos na postagem Já estávamos "parados", comecemos a trabalhar), o que contradiz a aplicabilidade do conceito “unanimedade” nessa situação específica.   

Se a emoção e a indignação (legítimas) da Diretoria e da massa dos professores presentes não permitiram que os (pouquíssimos) votos dissentes não fossem contados, nem por isso eles deixaram de existir. Acontece que, na sociedade midiática, uma coisa só passa a “existir” ou um discurso só é “verdadeiro”, se são divulgados e legitimados pelos meios de comunicação de massa. No caso aqui citado, a deflagração da greve de forma “unânime” passou para a história oficial porque a Globo assim o noticiou.

Outro problema por mim percebido foi no Diário de Pernambuco. No Caderno Aurora, do dia 09 de setembro, que traz uma reportagem sobre moradores de cabaré. A reportagem, que prometia apresentar o “cotidiano em carne viva de lares nada convencionais”, não passou da mera descrição do cotidiano de seres humanos alijados do processo de produção e consumo dos bens materiais e simbólicos. Em nenhum momento a reportagem aponta para as causas dessa realidade que ela diz retratar. Quem são esses seres humanos? Por que são obrigados a vender/comprar/alugar corpos? Qual a relação do “comportamento” desses seres humanos com a desigualdade social? Com a falta de educação? Por qual razão seus lares não são convencionais? Por escolha? Por opção? Devido à situação sócio-histórica?

Mais recentemente, gostaria de destacar a cobertura do festival No Ar Coquetel Molotov, feita por outros dois jornais pernambucanos, a Folha de Pernambuco e o Jornal do Comércio. No primeiro semestre conheci uma banda de Curitiba chamada ruído/mm. Sabendo que eles iriam tocar no Festival no sábado, dia 22 de setembro, fui conferir o som da galera. Na segunda-feira, dia 24, tive acesso a duas coberturas feitas pelos cadernos de cultura dos dois periódicos acima citados.

Não nego que meu olhar já estava procurando possíveis deslizes que pudessem corroborar as ideias que estou defendendo aqui, principalmente que devemos ter uma postura crítica, reflexiva e seletiva diante da avalanche de informações às quais estamos expostos diariamente.

Na folha, me chamou atenção a observação de que o show do Madrid, “banda de Adriano Cintra e Marina Vello, salvou a noite na Sala Cine”. Se eu fosse um leitor desatento, sem uma postura crítica e reflexiva, tomaria esse juízo de valor do jornalista como juízo de fato. Ora, o jornalista tem todo o direito de fazer julgamentos de valor, mas sua observação é, no mínimo, discutível (aliás, como todo juízo de valor!): O que exatamente ele está querendo dizer com “salvou a noite”? Que o show do Madrid foi o mais eficiente? Sob quais aspectos? Técnicos? Estéticos? De empatia com o público?  Já no Jornal do Commércio o "vacilo" foi com a veracidade dos fatos narrados. Falando sobre o show da ruído/mm o jornalista disse que a banda era mineira. Na verdade, a banda é curitibana! Alguém poderia dizer que isso é irrelevante, mas para quem  gosta não só de sentir, mas também compreender o que ouve (como é o meu caso), o lugar de origem da música é um dado a ser considerado.

Apesar de reconhecer que os meios de comunicação de massa, por atenderem ao gosto médio da população e estarem a serviço de grupos econômicos privados, acabam homogeneizando valores, comportamentos e ideias, não sou daqueles que “demonizam” a mídia, enxergando apenas sua função alienadora e manipuladora.

Nenhum meio de comunicação é, a priori, bom ou mal. Não há dúvida de que os grandes veículos de comunicação, por fazerem parte da indústria cultural, estão comprometidos com a ideologia da classe dominante, no entanto, não somos apenas receptores passivos, ou seja, “alguém que simplesmente recebe tudo o que lhe dão sem realizar nenhuma elaboração pessoal, sem fazer nenhuma síntese.” (ARANHA, M.L. e MARTINS, M.H.Temas de filosofia, 2006, p. 63)

No meu modo de ver, mais importante do que discutir se os meios de comunicação massificam, alienam ou estimulam a violência, a sexualidade e o consumismo, é a discussão sobre a necessidade de desenvolvermos uma leitura crítica sobre a mídia, que leve em conta a reflexão sobre as mensagens transmitidas e sua devida contextualização.

Para quem não consegue ler criticamente os meios de comunicação de massa, ao invés de ser o quarto, a mídia se configura como o "Primeiro Poder", no sentido de ser a principal fonte de valores, informações e conhecimentos, além de influenciar o comportamento da maioria das pessoas.