sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Ok, computador!


No último domingo, 02 de setembro, fui vítima da minha limitação digital. Abri o blog e antes de começar a escrever a postagem dominical estava dando uma mexidinha aqui, organizando alguma coisa ali, quando de repente fiquei sem várias funções de edição do blog, entre elas postar vídeos, links, nem mesmo formatar os textos. Na segunda-feira, inclusive, cheguei a publicar um informe explicando o ocorrido.   

Vocês não sabem o desespero que tomou conta de mim! Como já falei por aqui no blog, sou autodidata (obviamente que tenho diploma, mas o que aprendi não veio de nenhum professor, mas do meu próprio esforço!),  não só no que se refere à educação formal, como também à cultura digital. Até fevereiro do presente ano, este que vos escreve apenas utilizava a internet para enviar e receber emails (às vezes), ouvir, assistir e baixar músicas e vídeos. Foi aí que, dentro do meu processo de formação continuada, percebi o potencial crítico, criativo e pedagógico das tecnologias da informação e da comunicação.

Na verdade, sempre soube da importância da tecnologia no mundo contemporâneo, mas, devido ao meu analfabetismo digital, por sua vez fruto do meu analfabetismo funcional (é prezado leitor, prezada leitora, apesar de hoje em dia eu ter uma certa competência para ler e escrever, fui, até bem pouco tempo, vítima da péssima qualidade da educação brasileira que exclui seis de cada dez brasileiros da cidadania efetiva, pois não sabem ler e compreender textos mais elaborados), nunca me preocupei  em dominar a linguagem da internet.

Passei a investir, então, na minha alfabetização digital, na verdade, um corolário (caso algum dos seis brasileiros em cada grupo de dez que não sabe ler adequadamente tiver acesso ao presente texto, corolário é a consequência de uma verdade já estabelecida, ou seja, uma consequência nCecessária de uma proposição já demonstrada) do investimento que venho fazendo nos últimos dois anos para aprimorar minhas competências leitora e escritora. Depois de fazer um verdadeiro intensivo, hoje escrevo e edito o blog Cabeça Bemfeita e tenho até perfil no facebook!
Eis que domingo último um incidente me fez ver o quanto nossa limitação com relação ao domínio dos diferentes códigos (seja a língua materna, a linguagem da internet, ou mesmo o inglês, língua universal dissiminada pelo mundo através dos países hegemônicos do capitalismo, Inglaterra nos séculos XVIII e XIX, EUA, no XX) pode prejudicar nossos projetos. Simplesmente havia apertado, sem querer, claro, um comando que permite ao usuário do blog editar textos e diagramar sem se limitar as possibilidades sugeridas pelo programa. Só que, quando tal recurso foi acionado, várias outras funções que paulatinamente foram por mim dominadas, ficaram inacessíveis. 

Tal fato, além de mais uma vez pôr à prova as competências reflexivas que venho construindo, uma vez que precisava avaliar a situação, identificar o problema e solucioná-lo, serviu também para fornecer o tema da postagem de hoje: a importância das tecnologias da informação e da comunicação no trabalho pedagógico.

Melhor do que ninguém, nós, professores e professoras, sabemos o quanto a tecnologia está presente no cotidiano dos nossos/nossas estudantes. Jogos eletrônicos, redes sociais, celulares, ou mesmo mídias mais tradicionais, como o cinema e a televisão, disputam corações e mentes da chamada Geração Z com nossas disciplinas, atividades de sala e casa, avaliações e métodos didáticos caros à sociedade industrial, mas incompatíveis com as exigências da chamada era da informação, da comunicação e do conhecimento, fundamentada, justamente, pelas tecnologias da informação.

Bem, tal “competição”, entre saberes escolares (educação formal) e saberes da vida (educação informal), não se sustenta em uma escola reflexiva, pois, como sua práxis é intencional, sabe que toda teoria (disciplinas) nasce da prática social, ou seja, da vida, já que as leis e conceitos científicos são fruto da observação, problematização e construção de esquemas explicativos sobre a realidade natural e cultural.

 Acredito que os professores e as escolas deveriam se apoderar criticamente da linguagem que os/as estudantes fazem uso para levá-los/las à uma reflexão crítica sobre que ferramentas são essas que esses jovens têm acesso cada vez mais cedo, a quais interesses servem, quais suas finalidades, quando e como devemos utilizá-las, superando, assim, os preconceitos e o discurso do senso comum.
 
Segundo Maria Lúcia de Arruda Aranha, “desde o final da década de 1960 e de modo acelerado na década seguinte, a revolução da tecnologia da informação, pela disseminação do uso de computadores e das facilidades de comunicação processadas pelas infovias, tais como a World Wide Web (literalmente, ‘teia do tamanho do mundo), inaugurou um mundo novo da chamada sociedade da informação, caracterizada pela valorização dos produtos de informação.” (ARANHA, Maria Lúcia de Arruda,.Filosofia da educação. 3 ed. rev. e ampl. São Paulo, Moderna, 2009, p. 66)

Como não poderia deixar de ser, a educação sentiu o impacto de tais mudanças, pois  o acelerado desenvolvimento científico e tecnológico impôs "à escola um novo posicionamento de vivência e convivência com os conhecimentos capaz de acompanhar sua produção acelerada.” (Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio). As tecnologias da informação e comunicação vêm promovendo alterações “no comportamento das pessoas e essas mudanças devem ser incorporadas e processadas pela escola para evitar uma nova forma de exclusão, a digital.” (Ibidem)
 
O professor que leciona no mundo de hoje não pode deixar de utilizar as tecnologias da informação e da comunicação sob pena de ver a qualidade do seu trabalho ficar seriamente comprometida. Tanto é verdade que as diretrizes propostas no I Plano Nacional de Educação 2001-2010 colocam o "domínio das novas tecnologias de comunicação e da informação e capacidade para integrá-las à prática do magistério" como um saber que o professor deve ter, ao lado de outras qualidades necessários para o exercício da profissão, como "sólida formação teórica nos conteúdos específicos a serem ensinados na Educação Básica, bem como nos conteúdos especificamente pedagógicos" e a "pesquisa como foco formativo" (Ibidem, 2010, p. 30).
 
 No entanto, como diz Guilherme Canela Godoi, coordenador de comunicação e informação no Brasil da Unesco, “ainda é muito incipiente a formação de professores com a perspectiva de criação de competências no uso das tecnologias na escola.”

 Para Lynn Alves, pedagoga citada no texto Educação e Tecnologia: uma aliança necessária, a equalização entre educação e tecnologia é muito difícil de ser conseguida. Segundo ela, os professores “até admitem utilizar o computador e a internet para preparar as suas aulas, mas não conseguem ainda utilizar as mesmas nas suas atividades em sala de aula, como instrumento pedagógico”.

Difícil, realmente, é, mas não impossível. Eu que o diga: saí de uma condição de analfabetismo digital para a condição de produtor de informação e conhecimento. Tudo isso porque revi preconceitos e limitações e passei a utilizar a tecnologia como importante ferramenta de trabalho, não só para dialogar melhor com a garotada, mas, principalmente, poder potencializar meu processo de formação continuada e melhor expressar minhas ideias e posicionamentos.

Apesar do meu encantamento com o universo tecnológico e de já estar percebendo a mudança na qualidade do meu trabalho proporcionada pela minha inclusão no ciberespaço, tanto é que tecnologia é um dos conceitos fundamentais para meus projetos pessoais e profissionais, tenho consciência que o ainda incipiente domínio das novas tecnologias de comunicação e da informação e a capacidade para integrá-las às minhas práticas pedagógicas vieram em decorrência do meu aprimoramento como leitor e escritor.

Afinal, prezado, leitor, prezada, leitora, se somos leitores e escritores competentes, somos capazes de decodificar a realidade nos mais variados códigos e linguagens.



Zebé Neto
filósofo, escritor e educador
 
 
P.S. Para quem não se "ligou", o título da postagem é uma referência direta ao disco "Ok Computer", terceiro álbum de estúdio da banda britânica Radiohead, lançado em 1997 e considerado pela crítica especializada um dos melhores álbuns de rock da década de 1990 (na minha opinião, um dos melhores de todos os tempos).  As letras do disco trazem reflexões sobre a chamada sociedade pós-industrial, evidenciando questões sobre tecnologia, consumo, individualismo, ideologia e alienação.


Assim como a banda liderada por Thom Yorke disse para o "computador", ou seja, para a tecnologia: "Tudo bem, você está aí! Aproveitemos crítica e criativamente o que você tem de melhor e denunciemos quando seu uso se destinar a desumanização", digo eu: "Vou utilizar as tecnologias da informação e comunicação para superar minhas limitações intelectuais, políticas e estéticas e, ao mesmo tempo, oferecer uma reflexão crítica sobre as implicações éticas que o uso destes meios/instrumentos acarretam." 



Fiquem com três grandes hits do Ok Computer: "Paranoid Android", "Karma Police" e "No Surprises".


 
 
 
 
 
 
 
*** 

 
 E não deixem de conferir a Cabeça Bemfeita TV e a Rádio Cabeça. Na programação da primeira, vídeos selecionados a partir da palavra-chave "educação e tecnologia". Já na grade da Rádio Cabeça, uma galera que utiliza, uns mais, outros menos, a tecnologia para produzir suas composições. Os alemães do Kraftwerk, grupo pioneiro da música eletrônica, os ingleses do Massive Attack, banda ícone do Trip-Hop, música eletrônica marcada por batidas desaceleradas (menos de 120 bpm) e pela presença de instrumentos convencionais, a islandesa Björk, cantora, compositora, atriz, instrumentista e produtora musical e que se aventura no rock, jazz, música eletrônica, clássica e folclórica, e  o DJ Dolores, expoente da música eletrônica pernambucana, foram escalados para apresentar, na Rádio Cabeça, as possibilidades de texturas sonoras que a tecnologia pode ajudar a construir.

Na página FORMAÇÃO (DES)CONTÍNUA vocês encontram dois textos que continuam a discussão sobre tecnologia e educação. O primeiro traz uma reflexão proposta pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio sobre a mudança que as novas tecnologias vêm impondo à educação, enquanto o segundo, um ensaio on-line do especialista em mudanças na educação presencial e à distância, da USP, José Manuel Moran, apresenta a visão do estudioso sobre as consequências que as novas tecnologias têm provocado nessas duas modalidades de ensino.

Vou ficando por aqui.  Valeu a atenção e um forte abraço!
 
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário